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Protagonismo feminino em Hellraiser: Renascido do Inferno

Por Keyla Fernandes



Imagem do personagem Pinhead, do filme Hellraiser :Renascido do Inferno.
Nosso queridíssimo e icônico Pinhead, aqui interpretado por Doug Bradley, e que não aparece no livro.


The Hellbound Heart, do Clive Barker, foi lançado em 1986 e inspirou a série de filmes Hellraiser e foi publicado no Brasil pela Dark Side Books, com a tradução de Alexandre C’allari e sob o título de Hellraiser: Renascido do Inferno.



Hellraiser: Renascido do Inferno - Dark Side Books.

Com uma trama simples e poucos personagens, o livro conta a história de Frank, um hedonista que já não consegue mais sentir prazer em nada (e ele já fez de um tudo nessa vida), e encontra na lenda sobre a Configuração de Lemarchand promessas de prazeres inimagináveis, e acaba sendo tragado para o sombrio mundo dos Cenobitas, no qual a definição de prazer é bem diferente da dos humanos. Assim, ele desaparece sem deixar vestígios, mas sua ausência não é encarada com assombro pela família, acostumada com suas longas ausências.


Mas não é de Frank que quero falar.


Em Hellraiser, duas mulheres possuem papéis importantes que, inclusive, ganharam ainda mais destaque no primeiro filme da série, escrito e dirigido pelo próprio Clive Barker.


De um lado, temos Julia, uma beldade casada com Rory, irmão de Frank. Do outro, Kristy, uma amiga da família apaixonada por Rory. 

Julia possui a melhor construção de personagem do livro. Insatisfeita com a vida de esposa e dona de casa, não tem sentimentos significativos pelo marido e se ressente em saber que tudo o que ele vê nela é sua beleza, ostentando-a como um troféu. Além disso, Julia nutre uma paixão dolorosa por Frank, com quem teve um breve, porém intenso, caso logo antes de se casar, e alimenta esperanças de vê-lo novamente.



Julia (Clare Higgins) e Frank (interpretado em sua forma monstruosa por Oliver Smith).


Sem encontrar estímulos em sua vida ao lado do marido, Julia se vê apenas seguindo o fluxo de uma vida estável, mas sem emoções. No entanto, isso muda completamente quando ela descobre ser possível ter Frank de volta quando o sangue de um ferimento de Rory, derramado no cômodo da casa onde a invocação dos Cenobitas foi feita, é absorvido pelo que restava de Frank. Essa criatura, ainda desprovida de um corpo completo, pede a ajuda de Julia para se libertar. Em nome da ardente paixão por Frank, Julia aceita a missão de seduzir e levar homens até o quarto úmido onde seu amante monstruoso se esconde, assim ele pode consumi-los e reconstruir sua forma humana. 



Kirsty é apaixonada por Rory, e se mantém próxima da família, mesmo se sentindo esmagada pela presença de Julia, contra quem ela não tem nenhuma chance aos olhos de Rory.

É ela quem encontra, sem querer, a Configuração de Lemarchand no quarto úmido (Julia chama assim o aposento onde Frank se encontra, onde ela também encontra e confronta o próprio Frank, que está se refazendo aos poucos, graças aos sacrifícios realizados por Julia. Kirsty consegue escapar pulando a janela, se fere e vai parar num hospital, onde acaba por se entreter com a caixinha misteriosa e liberta, sem querer de novo, um Cenobita (que ganhou a icônica imagem de Pinhead no filme).

Para não ter sua alma aprisionada na dimensão de prazer e dor daquelas criaturas costuradas e cheias de ganchos, Kirsty barganha com o Cenobita, prometendo levá-lo até Frank, que havia conseguido fugir de sua punição, se ele a deixasse livre.



Frank confrontando Kirsty (Ashley Laurence).


As duas assumem funções antagônicas dentro da história, e a narrativa é toda movimentada por elas. Kirsty e Julia tem a vida de Frank em suas mãos, mas ambas também correm grandes riscos por conta da trama na qual estão envolvidas.


Sim, Julia faz coisas horríveis impulsionada pelo seu amor por Frank e pelo desejo de abandonar sua vida monótona. Ela não é uma boa pessoa, mas possui muita força e coragem para fazer essas coisas em nome da paixão e do desejo. Ela também não se encaixa no estereótipo de vilã histérica e vingativa, como estamos acostumados a ver em histórias de terror. Ela é movida pelos próprios desejos, por amor e por uma latente sede de sangue despertada por Frank, e age de forma a mudar a própria história, levando isso até as últimas consequências.



Diva sanguinária ♥


Contrariando a ideia da donzela em perigo, Kirsty assume o protagonismo, indo contra forças maléficas bem maiores e mais poderosas que ela para salvar a própria vida. Longe de ser uma personagem passiva, presente apenas para sofrer e estimular o imaginário masculino, ela enfrenta o Inferno, literalmente, tudo isso de uma forma muito humana e realista. Apesar de não ser a final girl chorosa, as reações de Kirsty à toda desgraceira à sua volta são muito críveis.


Entre diversas outras características que me agradaram em The Hellbound Heart, suas protagonistas e a forma como são caracterizadas e construídas, são com certeza as minhas favoritas. Clive Barker consegue superar com maestria os clichês do terror relativos a figuras femininas, e trazer representações de mulheres interessantes, com quem conseguimos nos conectar.


É interessante ver personagens femininas complexas e diferentes entre si, criadas na década de 1980 e dentro de um gênero ainda muito apegado aos clichês misóginos, geralmente apoiados na sexualização e vitimização das mulheres, bem como na fetichização da violência cometida contra elas.


Kirsty, a final girl que passou pelo Inferno por causa de uma caixinha bonitinha.

OBS: No filme, Kirsty é filha de Rory (chamado de Larry), uma adaptação que valorizou ainda mais a personagem e suas motivações.


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